Como ficou a licença-maternidade após a recente decisão do STF?

Supremo entendeu que o marco inicial é a alta hospitalar da mãe ou do recém-nascido, o que ocorrer por último

Hoje, sexta-feira, é dia de mais um capítulo do projeto “Dúvida Trabalhista? Pergunte ao Professor!” dedicado a responder às perguntas dos leitores do JOTA, sob a coordenação acadêmica do professor de Direito do Trabalho e coordenador trabalhista da Editora Mizuno, Dr. Ricardo Calcini.

O projeto tem periodicidade quinzenal, cujas publicações são veiculadas sempre às sextas-feiras. E a você leitor(a) que deseja ter acesso completo às dúvidas respondidas até aqui pelos professores, basta acessar o portal com a  # pergunte ao professor

Neste episódio de nº 94 da série, a dúvida a ser respondida é a seguinte:

Pergunta ► Como ficou a licença-maternidade após a recente decisão do STF?

Resposta ► Com a palavra, a professora Viviane Lícia Ribeiro.

O afastamento do trabalho em razão do nascimento ou adoção de filho enseja a percepção do salário-maternidade durante o período da licença, salário esse fundamental em razão do momento de dedicação e cuidados com uma nova criança na família.

Contudo, o que causava polêmica até então era o início da contagem do prazo de concessão desse salário quando houvesse internação por mais de duas semanas da mãe ou do recém-nascido, em virtude de complicações relacionadas ao parto.

A fim de tentar amenizar tal situação, o Supremo Tribunal Federal (STF) em cumprimento de decisão cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6327, proferida em março de 2022, já havia determinado a possibilidade de prorrogação do benefício do salário-maternidade quando em decorrência de complicações médicas relacionadas ao parto e, claro, se houvesse necessidade de internação hospitalar da segurada e/ou do recém-nascido por mais de duas semanas, nos termos da Portaria Conjunta nº 28, de 19 de março de 2021.

Ao analisar à época o pedido liminar, o relator, ministro Edson Fachin, afirmou que, apesar de ser possível a extensão da licença em duas semanas antes e depois do parto mediante atestado médico e, ainda, de haver previsão expressa de pagamento do salário-maternidade no caso de parto antecipado, não há no ordenamento jurídico, porém, previsão de extensão no caso de necessidade de internações mais longas, especialmente em nascimentos prematuros (antes de 37 semanas de gestação).[1]

Isso ocorre pois, em muitos dos casos, após o parto, as internações podem se prolongar por período superior a duas semanas, o que, na prática, faz com que mãe e/ou criança precisem de um tempo maior para fins de recuperação e, por conta disso, passem a necessitar do salário-maternidade durante todo o período da internação, além, claro, dos 120 dias (180 dias se empresa cidadã) a que já fariam jus, contados a partir da alta de internação da mãe ou do recém-nascido, iniciando-se a partir daquela que acontecer por último.

Em 2017, aliás, foi apresentado o PL 8702/17, de autoria da deputada Renata Abreu, que, por enquanto, aguarda apreciação por parte do Senado Federal e que visa acrescentar um parágrafo ao artigo 392 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para dispor sobre a suspensão da contagem do período da licença-maternidade até a alta hospitalar nos casos de internação de recém-nascido superior a três dias.

O grande problema do projeto, porém, é que nesse caso a remuneração também será suspensa e a trabalhadora vai precisar retornar ao serviço. Embora a intenção originária fosse a de manter o pagamento das trabalhadoras, estendendo apenas o período de licença, houve apreciação de substitutivo no plenário da Câmara para que o pagamento do salário-maternidade ficasse suspenso, sendo retomado apenas quando efetuado novo pedido de licença-maternidade.

A partir de todo esse cenário, o plenário do STF tornou definitiva, na sessão virtual finalizada no último dia 21 de outubro, a liminar concedida pelo relator, ministro Edson Fachin, confirmando que o marco inicial da licença-maternidade e do salário-maternidade é a alta hospitalar da mãe ou do recém-nascido – o que ocorrer por último.

A Suprema Corte entendeu que deve ser dada concretude ao direito social de proteção à maternidade e à infância, afinal, a omissão legislativa resulta em proteção deficiente tanto às mães quanto às crianças prematuras que, embora demandem mais atenção ao terem alta, têm esse período encurtado, porque o tempo de permanência no hospital é descontado do período da licença-maternidade.

Em arremate, mesmo que em trâmite no Congresso Nacional projeto de lei buscando regulamentar a questão como dito acima, isso não impediu o deferimento do pedido pelo STF que, inclusive, referiu também que a fonte de custeio para a implementação da medida já existe, considerando que a Seguridade Social deve ser compreendida integralmente, como um sistema de proteção social que compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade.

Contudo, apesar de a ideia original mostrar-se interessante, o substitutivo ao PL acabou por transformar a proposta que originariamente seria benéfica em algo não só burocrático, mas prejudicial ao orçamento familiar, fazendo com que a situação permanecesse ruim para as trabalhadoras.

Assim, apenas com a decisão proferida pelo STF, recentemente (em 21/10), passou-se a garantir o início da licença-maternidade a partir da alta hospitalar da mãe ou do recém-nascido em caso de as internações ultrapassarem duas semanas e não da data do parto. Referida decisão tem efeito imediato e beneficia as hipóteses em que bebês ou mães precisem ficar mais tempo no hospital, já que a forma convencional de contagem da licença acaba reduzindo o convívio entre mães e filhos, prejudicando até mesmo a questão do aleitamento materno.

No voto proferido pelo ministro Edson Fachin há menção de que o período de convivência fora do ambiente hospitalar entre mães e recém-nascidos acaba por ser reduzido de modo irrazoável e conflitante com o direito social à proteção à maternidade e à infância, assegurado pela Constituição.

Justificou que a CLT e a lei que trata de benefícios da Previdência Social devem assegurar a “proteção à maternidade e à infância”, conforme determina a Constituição Federal. Ele indicou haver “omissão legislativa quanto à proteção das mães e crianças internadas após o parto”, argumentando que “o fato de tramitar proposição há mais de cinco anos denota que a via legislativa não será um caminho célere para proteção dos direitos invocados”.

O ministro igualmente afastou o argumento acerca da necessidade de fonte de custeio para pagar a extensão da licença uma vez que não há a criação de uma nova prestação social. Além disso, cita jurisprudência do tribunal no sentido de que a ausência de previsão de fonte de custeio não é barreira para extensão do prazo de licença-maternidade.

Dessa forma a questão passou a estar definida de maneira a não afrontar os direitos da gestante e, principalmente, os direitos do recém-nascido, obtendo-se proteção à maternidade e à infância.


[1] Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5870161> Acesso em 24.10.2022

[2] Disponível em :< https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5870161> Acesso em 24.10.2022

Fonte: JOTA

 

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