Riscos na possível mudança da regra de abatimento de incentivo de ICMS no IRPJ/CSLL

Empresários e parlamentares já começam a demonstrar preocupação com nova medida proposta por Haddad.

Representantes do setor empresarial já começaram a se movimentar junto a parlamentares contra a proposta do ministro Fernando Haddad de impedir que benefícios dados pelos estados no ICMS para custeio das empresas continuem a ser deduzidos do IRPJ e da CSLL. E entre parlamentares já começam a surgir ideias para atenuar a eventual proposta (MP ou PL), que ainda estava sendo fechada no governo, como escalonar sua implementação.

Segundo Haddad, a revisão do “jabuti”, aprovado pelo Congresso em 2017, pode reforçar os cofres federais em até R$ 90 bilhões. Nas contas do economista-chefe e sócio da Warren Rena, Felipe Salto, o impacto fica entre R$ 50 bilhões e R$ 65 bilhões.

Apesar da grande diferença entre as estimativas, os números são muito expressivos, representando boa parte do ajuste do lado da receita que Haddad quer fazer. E provocam imediatamente uma reflexão sobre os impactos que tal medida pode ter na economia, como risco de pressionar a inflação no curto prazo ou promover uma redução brutal de margem em setores que estão com problemas no curto prazo.

Desde a última sexta-feira (31), quando a iniciativa passou a ser noticiada no cardápio de possíveis ações do governo, há uma crescente inquietação no setor privado, desde empresários propriamente ditos a investidores em ações. Indústria e varejo (que além de tudo passa por dificuldades de acesso ao crédito por conta do episódio Americanas), grandes beneficiários de incentivos do ICMS, seriam os maiores prejudicados com a decisão.

Um representante setorial disse ao JOTA que a medida é uma “loucura” e salientou que mudar as regras sem trazer os afetados para a mesa de discussão seria criar insegurança jurídica brutal. Essa fonte também demonstra estranhamento com a discussão surgindo e podendo ser implementada por Medida Provisória no mesmo contexto no qual a Fazenda defende uma reforma tributária e fala de reindustrialização.

Outro interlocutor não só ressalta a suposta insegurança jurídica, mas também salienta que isso vai contra o discurso de reindustrialização propugnado pelo governo. Essa liderança empresarial aponta que onerar incentivos fiscais é, sim, aumento de carga tributária e que altera a taxa de retorno dos projetos de investimento. Nesse sentido, lembra que a reforma tributária pretende por si só acabar com os incentivos e que o governo poderia esperar e evitar mais esse “puxadinho”.

Em evento de posse da nova diretoria da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo, na noite desta terça-feira (4), empresários e parlamentares apontaram à coluna preocupação com a medida, reforçando a mensagem de que, no fim das contas, será um aumento expressivo de carga tributária. Além disso, a iniciativa vai na contramão do discurso e do esforço de simplificação tributária. Fontes destacaram ainda que não é tão simples quanto a fala do ministro faz parecer a distinção entre benefícios para investimento e para custeio.

Mesmo no governo, já há gente olhando com preocupação o movimento da Fazenda.

Para Felipe Salto, que também já foi secretário de Fazenda de São Paulo, a ideia da Fazenda está na direção correta e é necessária. “Essa é mais uma dimensão da guerra fiscal, no fundo. O ovo da serpente foi posto na lei da convalidação de benefícios em 2017. Deixou-se passar esse gigantesco jabuti. É um mastodonte, não um jabuti. Subvencionar custeio é o fim da picada e é o que está a ocorrer”, disse. “Isso precisa ser corrigido em benefício de melhorar a alocação de recursos econômicos e evidentemente recompor a arrecadação tributária federal”, completou.

Ele reconhece que a medida pode ter repercussões como algum impacto inflacionário no curto prazo, mas aponta que isso depende de muitos elementos e pode ficar diluído. “Pode haver [impacto inflacionário], mas dependerá muito de diversos fatores, como a elasticidade-preço da demanda de cada setor de que estivermos tratando. No geral, isso vai se diluir, até porque a medida ajudará no aspecto macro a controlar a inflação, reduzindo renda disponível”, explicou.

Haddad apresentou um arcabouço fiscal que demanda reforço no lado das receitas. E dos grandes, já que é ambiciosa a meta de transformar um déficit de 1% do PIB em superávit da mesma magnitude (um ajuste total de 2% do PIB) em um intervalo de três anos e com aumento real de despesas em todo o período.

Seu discurso tem sido de que não vai aumentar a carga tributária, e sim cobrar de quem não paga ou de quem paga pouco. A despeito de ser meritório buscar um sistema no qual todos recolhem tributos de maneira mais equânime e conforme sua capacidade contributiva, fechar brechas como essa do abatimento dos incentivos do ICMS é aumento sim de carga tributária.

Dada a aparente convicção do ministro sobre ela, a questão passa a ser como fazer isso de maneira que se tenha menos impactos econômicos negativos. Talvez a ideia de um ajuste escalonado, como o considerado pelo experiente parlamentar ouvido pelo JOTA, seja um caminho que mereça pelo menos consideração.

O governo está correto em olhar também para o lado das receitas e está tendo algumas boas ideias. Mas precisa estar atento para não criar um clima de crescente insegurança e má vontade sobre o cenário tributário, que, se ocorrer, pode levar os empresários a congelar investimentos, fazendo o crescimento do PIB perder fôlego, prejudicando a arrecadação.

Fonte: JOTA

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