STJ e STF deverão reconstituir os juros de mercado ao JCP

Já existem cinco ações em análise no STJ, e a esperança que se faça justiça nas esferas superiores é grande

A complexidade matemática e a falta de transparência fizeram com que o mercado não se desse conta de um brutal e indevido aumento de carga tributária para as empresas de lucro real trazido pela MP 1921/1999, que alterou a fórmula da TJLP. A TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) havia sido criada em 1994 para indexar os financiamentos do BNDES, de forma que eles sofressem incidência de juros efetivamente de mercado. A fórmula era simplesmente a média dos juros dos títulos brasileiros de longo prazo, já embutida a inflação futura.

No final de 1995, o governo propôs uma importante reforma do imposto de renda, acabando com a correção monetária de balanço, isentando os dividendos e criando os Juros sobre o Capital Próprio (JCP) com tributação igual à do mercado financeiro de 15%, de forma a estimular os investidores a trocarem o ganho certo do mercado financeiro por investimentos em negócios, gerando emprego e desenvolvimento, sem o ônus de substituir os 15% de IRRF pelos 34% de tributação das empresas sobre o ganho que já vinha sendo auferido. Acertadamente, a taxa de juros escolhida à época foi a TJLP.

Já em 1999, o cenário econômico fez o governo apresentar a MP 1921, com uma forte redução dos juros do BNDES para baratear o crédito no país, e para isso propôs que a fórmula da TJLP passasse a ser a meta de inflação e um prêmio de risco a ser definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O Congresso, baseado na exposição de motivos desta MP, que se restringia ao propósito de baixar o custo de crédito, aprovou a norma sem perceber o efeito colateral de redução indevida do teto do JCP.

A conhecida baixa meta de inflação e o estranho uso de um prêmio de risco no lugar de juros reais provocaram, nestas duas décadas, em média, uma TJLP equivalente à metade dos juros de mercado e, consequentemente, fazendo as empresas tributarem a 34% metade dos juros que os investidores ganhariam no mercado financeiro, cuja tributação teria sido de apenas 15%.

Em 2017, o governo federal decidiu parar de subsidiar os encargos dos financiamentos do BNDES, voltando a aplicar os juros de mercado através da criação de uma nova taxa chamada TLP, que consiste na inflação real somada à média dos juros reais dos títulos NTN-B de 5 anos, similar à fórmula original da TJLP. Porém, a nova MP 777 restringiu o uso da TLP para esta finalidade, mantendo a TJLP manipulada para os JCP.

A diferença acumulada entre as duas taxas está em 110%. Como exemplo, o ano de 2021 teve uma TJLP de 4,81%, enquanto a fórmula da TLP com IPCA sem redutor alcançou 14,08%.

Foi no dia da publicação desta Medida Provisória que conseguimos visualizar o quanto a MP de 1999 teria sido maléfica e percebemos que seria algo judicializável.

Seriam três argumentações independentes: a inconstitucionalidade formal da MP 1921 quanto à extensão ao JCP, já que o devido processo legislativo não foi respeitado pela falta de transparência na exposição de motivos; a ilegalidade formal da MP por desrespeito à Lei Complementar 95/1998, por não ter explanado as consequências tributárias da norma; e a inconstitucionalidade e ilegalidade material da referida MP por desrespeitar os princípios da capacidade contributiva, da isonomia e do conceito de Renda.

A inconstitucionalidade material tem um paradigma perfeito, que foi a decisão do STF pela inconstitucionalidade do expurgo de 70% da inflação no índice utilizado na época do Plano Verão para a correção monetária de balanço.

Desde as primeiras ações no final de 2020 até agora, já são 40 dos maiores grupos econômicos a acionarem a justiça em diversos segmentos, como bancos, energia, siderúrgicas, indústrias, varejistas, seguradoras etc.

Já conseguimos sentenças favoráveis, mas, em vários casos, a primeira instância e várias turmas dos TRFs não deram provimento, seja por confusão de que a causa de pedir seria a inconstitucionalidade da MP 777 por não estender a TLP ao cálculo dos JCP, ou que, sendo o JCP um benefício fiscal, valeria a interpretação literal.

Estamos combatendo essas distorções nos processos, afinal, a ação se remete às inconstitucionalidades da MP 1921/99 e não da MP 777/2017, da qual sugerimos aproveitar a fórmula da nova taxa TLP baseada apenas na NTN-B por resgatar adequadamente a TJLP original. Esta deixou de ser calculada oficialmente pelo Banco Central desde 2000, e representava uma complexa média de uma série de títulos públicos que tinham inflação projetada e não a real, e pelo JCP não ser um benefício fiscal, e sim uma regra do ordenamento jurídico para equalizar as tributações das empresas e seus acionistas. Mesmo que fosse, a interpretação literal não imporia o respeito a uma sigla correspondente à taxa de juros de longo prazo e que passou a ser metade dela.

Nossa versão pioneira, que se iniciou com o protocolo da primeira ação em 8 de dezembro de 2020, contém elementos importantes, tais como: parecer de jurista especializada sobre a inconstitucionalidade formal, cuidado em desconsiderar o fator de redução da TLP, pedido de não aplicabilidade da prescrição por não ser repetição de indébito, manutenção do direito mesmo com uma futura extinção do JCP pelo princípio da irretroatividade imprópria, aplicação da Selic ao passado, uso do paradigma da ação de correção monetária complementar no Plano Verão, descaracterização do JCP como benefício fiscal, eventual literalidade ser da taxa de juros de longo prazo e não de sua sigla TJLP, não pedido de liminar para evitar a perda do IRRF, cálculo preciso da fórmula da TLP de 2004 a 2017 baseado nos juros da NTN-B e no IPCA, aplicação por analogia do conceito do STF quanto à manutenção integral do índice de correção monetária de balanço enquanto a figura jurídica existir.

Já existem cinco ações em análise no STJ, e a esperança que se faça justiça nas esferas superiores é grande. As demais empresas devem ficar muito atentas ao risco das eventuais prescrições e modulações.

Fonte: JOTA

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