Equiparação Hospitalar para Sociedades Limitadas Unipessoais: Benefícios Fiscais e Requisitos para Clínicas no Lucro Presumido

A recente Solução de Consulta COSIT nº 60/2025 trouxe importantes esclarecimentos sobre a aplicação de percentuais reduzidos de IRPJ (8%) e CSLL (12%) para Sociedades Limitadas Unipessoais (SLUs) que prestam serviços hospitalares no regime do Lucro Presumido. Este artigo analisa os critérios para acesso a esse benefício fiscal e suas implicações para o planejamento tributário de clínicas e estabelecimentos de saúde.

O Marco Regulatório da Equiparação Hospitalar

A legislação tributária brasileira estabelece condições especiais para determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL no regime do Lucro Presumido quando se trata de prestação de serviços de saúde. Conforme a Solução de Consulta COSIT nº 60/2025, as empresas prestadoras de serviços hospitalares podem aplicar percentuais de presunção significativamente menores (8% para IRPJ e 12% para CSLL) em comparação com o percentual padrão de 32% aplicável à maioria dos serviços .

Essa redução representa um benefício fiscal substancial, diminuindo diretamente a base de cálculo sobre a qual incidem as alíquotas de 15% (mais adicional de 10%, se aplicável) do IRPJ e 9% da CSLL. Para uma receita bruta de R$ 1.000.000,00, a diferença entre aplicar 8% ou 32% como base de cálculo do IRPJ resulta em uma economia tributária de R$ 36.000,00 apenas nesse imposto.

Requisitos para Acesso aos Percentuais Reduzidos

1. Natureza Jurídica como Sociedade Empresária

O primeiro requisito fundamental é que a empresa prestadora dos serviços de saúde esteja organizada como sociedade empresária, tanto de direito quanto de fato. A Solução de Consulta COSIT nº 60/2025 esclarece que a SLU preenche esse requisito desde que exerça profissionalmente atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços, com alocação dos fatores de produção .

Isso representa uma evolução importante, pois supera a antiga barreira que impedia as Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada (EIRELI) de acessarem o benefício. Com a transformação automática das EIRELI em SLUs pela Lei nº 14.195/2021, essas entidades passaram a ter potencial acesso aos percentuais reduzidos.

2. Conformidade com as Normas da Anvisa

O segundo requisito indispensável é o atendimento às normas estabelecidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), particularmente as definidas na Resolução RDC nº 50/2002. Essa conformidade deve ser comprovada por meio de licenças e alvarás sanitários.

3. Natureza dos Serviços Prestados

Os serviços devem estar enquadrados nas Atribuições 1 a 4 da RDC Anvisa nº 50/2002, que incluem:

1. Atribuição 1: Atendimento em regime ambulatorial e de hospital-dia

2. Atribuição 2: Atendimento imediato

3. Atribuição 3: Atendimento em regime de internação

4. Atribuição 4: Atendimento de apoio ao diagnóstico e terapia

Importante destacar que as simples consultas médicas estão expressamente excluídas do conceito de serviços hospitalares, mesmo quando realizadas em ambiente hospitalar.

A SLU como Sociedade Empresária: Mudança de Paradigma

A equiparação hospitalar para SLUs representa um avanço interpretativo que corrige um descompasso entre a norma legal e a evolução das formas de organização empresarial no país. Como destacado na Solução de Consulta, a SLU pode ser reconhecida como sociedade empresária desde que demonstre:

1. Organização econômica da atividade empresarial

2. Alocação dos fatores de produção (capital, trabalho, insumos)

3. Separação entre o profissional e a estrutura de negócios

4. Custos diferenciados em relação à mera prestação de serviços por parte dos sócios

Essa interpretação funcional da norma tributária privilegia o conteúdo econômico das operações sobre sua aparência formal, alinhando-se à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Implicações Práticas para as Clínicas

Para clínicas que desejam se beneficiar dos percentuais reduzidos, é essencial:

1. Verificar o enquadramento de seus serviços nas Atribuições 1 a 4 da RDC Anvisa nº 50/2002

2. Manter documentação comprobatória da conformidade com as normas da Anvisa

3. Estruturar a organização empresarial de forma a demonstrar a alocação dos fatores de produção

4. Segregar adequadamente as receitas de serviços hospitalares das demais (como consultas médicas)

A não observância desses requisitos acarreta a aplicação do percentual padrão de 32%, com significativo aumento da carga tributária.

Conclusão: Planejamento Tributário com Segurança Jurídica

A Solução de Consulta COSIT nº 60/2025 oferece maior segurança jurídica para o planejamento tributário de clínicas e estabelecimentos de saúde organizados como SLUs. Ao estabelecer critérios claros para aplicação dos percentuais reduzidos, permite que esses empreendimentos aproveitem legítimas economias fiscais, desde que cumpram os requisitos legais.

Como destacado, o benefício não é automático nem se aplica a todos os serviços relacionados à área de saúde. Requer análise cuidadosa da natureza dos serviços prestados, da estrutura organizacional e da documentação comprobatória. Nesse contexto, o apoio de contabilidade especializada em saúde torna-se fundamental para garantir o acesso ao benefício sem riscos de questionamentos futuros pela fiscalização.

Em um cenário de elevada complexidade fiscal, a equiparação hospitalar para SLUs não apenas equilibra o jogo competitivo, como fortalece o princípio da isonomia tributária – não mais pautado pela forma jurídica, mas pela substância econômica da atividade desenvolvida.

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