A inconstitucionalidade das Contribuições PIS/Cofins-Importação sobre serviços

Sentença inédita suspende incidência sobre prestação de serviços no exterior

Em setembro, foi proferida a primeira sentença – de que se tem conhecimento – sobre a inconstitucionalidade das Contribuições PIS/Cofins incidentes sobre a importação de serviços (Processo nº 5009377-66.2022.4.02.5101).

A sentença reconheceu a procedência dos argumentos que apresentamos no sentido de que, nos termos do Recurso Extraordinário nº 559.937/RS, a previsão constante do inciso II, do artigo 7º, da Lei nº 10.865/2004, afronta o conceito de “valor aduaneiro” adotado pelo artigo 149, § 2º, III, “a”, da Carta Magna, introduzido pela Emenda Constitucional nº 33/2001.

Ao utilizar um termo específico (“valor aduaneiro””), a Constituição Federal fez uso de uma definição existente no ordenamento jurídico, proveniente de normas nacionais e internacionais do direito privado e, portanto, nos termos do art. 110 do CTN, não é passível de ser ampliado nem restringido.

No caso, a base de cálculo desses tributos (“valor aduaneiro”) encontra-se disciplinada pelo artigo 2º, II, do Decreto-Lei nº 37/1966 (com redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472/1988), regulamentada pelo artigo 89, II, do Decreto nº 91.030/1985, posteriormente pelo artigo 75, I, do Decreto nº 4.543/2002 (vigentes na época da EC nº 33/2001) e, atualmente, pelo artigo 75, I, do Decreto nº 6.759/2009.

Todos esses dispositivos trazem, como base de cálculo do imposto de importação, “quando a alíquota for ad valorem, o valor aduaneiro apurado segundo as normas do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1994”.

A primeira versão do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (General Agreement on Tarifs and Trade ou GATT) foi assinada em 1947[1] e, em seu artigo VII, determinava que “o valor para fins alfandegários das mercadorias importadas deverá ser estabelecido sobre o valor real da mercadoria importada à qual se aplica o direito ou de uma mercadoria similar, e não sobre o valor do produto de origem nacional ou sobre valores arbitrários ou fictícios“.

O artigo 1, item 1, da parte I, do Acordo sobre a Implementação do artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 199, por sua vez, definiu que o “valor aduaneiro de mercadorias importadas será o valor de transação, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias, em uma venda para exportação para o país de importação, ajustado de acordo com as disposições do art. 8”.

Finalmente, o referido artigo 8º estabelece que o valor aduaneiro é o valor de transação da mercadoria ou royalties, quando relacionados com as mercadorias[2], com alguns ajustes.

Em resumo, o termo “valor aduaneiro”, adotado pela EC 33/2001, para fins de incidência das Contribuições PIS/Cofins-Importação, refere-se ao preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas, não podendo ser ampliado para comportar a importação de serviços!

O acima exposto é premissa para todos aqueles que atuam no comércio exterior. Tanto assim, que, em seu Recurso de Apelação, a própria PGFN assim se manifestou:

“Em que pese a afirmação no sentido de que a base constitucional (valor aduaneiro) revelaria identidade entre as hipóteses, certo é que o dimensionamento do valor aduaneiro aplicável à importação de mercadorias (previsto do Acordo GATT, nos termos do julgamento do Tema 01) não é extensível à imposição sobre a importação de serviços”.

Na busca de uma razão para sustentar seu recurso, a Il.ma PGFN, em um esforço hercúleo, adotou os dois únicos argumentos possíveis: (i) a utilização das referidas exações como instrumento de política extrafiscal; e (ii) uma suposta ausência de necessidade de a Constituição Federal ter adotado o termo “valor aduaneiro” para tratar dos serviços.

Quanto à primeira linha de defesa (extrafiscalidade das exações), devemos lembrar um trecho do voto do ministro Joaquim Barbosa no tocante à suposta política extrafiscal, quando do julgamento do referido RE nº 559.937/RS:

“Ademais, o argumento da União quanto à necessidade de isonomia tributária somente seria consistente se fosse demonstrado ser função da Cofins e da Contribuição ao PIS intervir ou regular o comércio exterior. Porém, a principal função desses tributos é arrecadatória e não extrafiscal”.

Em relação ao segundo argumento (não adoção do termo “valor aduaneiro” para fins de tributação das Contribuições PIS/Cofins-Importação incidente sobre serviços) devemos lembrar que no dia 30/08/22, por meio do Despacho 378/PGFN-ME, foi aprovado o Parecer SEI 4891/2022/ME, que incluiu na lista de dispensa de contestação e recursos o pleito de exclusão do ISS da base de cálculo das Contribuições PIS/Cofins-Importação/Serviços, em razão de não poderem ser incluídas na definição de “valor aduaneiro”, consoante reiteradamente decidido pelo STF:

“A despeito de não existir precedente vinculante sobre o tema, restou pacificado no âmbito do STF o entendimento de que as contribuições sociais sobre a importação que tenham alíquota ad valorem são calculadas com base no valor aduaneiro, a teor do art. 149, § 2º, III, “a”, da Constituição Federal, de modo que não se pode inserir na base de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre a importação de serviços o valor relativo ao ISSQN, conforme se verifica dos seguintes precedentes das duas turmas da citada Corte (…)”.

Portanto, em síntese, salvo se o STF decidir se retratar por completo, de tudo quanto foi afirmado no RE nº 559.937/RS, tem-se a incontestável inconstitucionalidade das Contribuições PIS/Cofins-Importação sobre serviços, por flagrante afronta ao termo constitucionalmente adotado para cobrança dessas exações, qual seja, “valor aduaneiro”.


[1] Internalizado no ordenamento jurídico pela Lei nº 313/1948; Decreto Legislativo nº 43/1950; Decreto Legislativo nº 30/1951; Lei nº 4.138/1962, Decreto nº 76.032/1975; Decreto nº 92.930/1986

[2] Os royalties, por sua vez, somente integram o valor aduaneiro se (i) relacionados com as mercadorias valoradas e, também, (ii) se cobrados como condição de venda das mercadorias

 

Fonte: JOTA

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