A União passará a recorrer à Justiça em caso de derrota no Carf?

Fica a dúvida sobre a real possibilidade de mudança e sobre a extensão do novo modelo

Causaram polêmica as medidas anunciadas na última quinta-feira (12/1) pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda). A volta do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e a abertura de uma transação tributária voltada ao contencioso administrativo têm gerado discussões, artigos e debates, com ferrenhos defensores de ambos os lados.

Um dos temas anunciados na coletiva tanto por Haddad quanto pelo secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, porém, ficou de fora do pacote de medidas da semana passada: a possibilidade de a União recorrer ao Judiciário após ser derrotada no Carf.

Apesar das falas, fontes do Ministério da Economia afirmaram ao JOTA que a alteração não está em estudo pela pasta. Fica, assim, a dúvida sobre a real possibilidade de mudança e sobre a extensão do novo modelo.

A possibilidade foi primeiramente anunciada por Haddad, que em meio a uma declaração sobre a paridade no Carf — o fato de o tribunal ser composto em igual número por conselheiros que representam o fisco e os contribuintes — afirmou: “O acórdão do Tribunal de Contas [da União] estimula a revisão da paridade, e nós não tocamos nisso. Nós só restabelecemos o voto de qualidade e a possibilidade de a Receita, tanto quanto o contribuinte, buscar o Judiciário, sobretudo em caso de teses pacificadas do ponto de vista jurisprudencial”.

Barreirinhas também tocou no ponto, porém deixando implícito que o recurso seria interposto apenas em caso de decisões administrativas contrárias à jurisprudência dos tribunais superiores. “Aqui nós temos uma situação excepcional. Temos teses favoráveis ao fisco consolidadas por exemplo no Superior Tribunal de Justiça e uma decisão administrativa em sentido contrário. Nós entendemos que nessa situação, não é em toda situação, é sim possível que a procuradoria leve a questão ao Judiciário”.

Apesar de não existir uma norma expressa sobre o tema, hoje a Fazenda Nacional não recorre ao Judiciário em caso de derrota no Carf. Os contribuintes, por outro lado, podem acessar a Justiça quando têm autuações mantidas na esfera administrativa.

Para especialistas, a impossibilidade de ir à Justiça faz sentido principalmente com a volta do voto de qualidade, por meio do qual o presidente da turma, que é sempre um representante do fisco, vota duas vezes em caso de empate. A medida garantiria o equilíbrio entre Fazenda e contribuintes, já que a sistemática tende a ser desvantajosa às pessoas físicas e jurídicas.

A posição é sustentada não apenas por advogados que representam contribuintes. Ao JOTA, uma fonte do Ministério da Fazenda salientou que faria sentido pensar em judicialização quando o Carf estava submetido ao desempate pró-contribuinte. A MP 1160/23, que faz parte do pacote anunciado no dia 12, porém, extinguiu a sistemática.

Outra crítica à possibilidade, por parte da União, de recurso à Justiça em caso de derrota no Carf diz respeito ao fato de, com o movimento, a Fazenda estar supostamente questionando um ato do Poder Público.

“A meu ver inexiste interesse processual da Administração para modificar suas próprias decisões perante o Poder Judiciário”, afirma Maysa Pittondo, sócia do CPMG Advocacia e da Numeris Consultoria e professora do mestrado profissional do IDP.

“Admitir que a Administração Pública pudesse se voltar contra essa decisão [do Carf] é reconhecer que o ‘Estado’ pode movimentar a máquina do ‘Estado’ para modificar um pronunciamento dado pelo próprio ‘Estado’”, complementa.

A argumentação foi comentada por Barreirinhas durante a coletiva de imprensa de divulgação do pacote econômico. Para o secretário, entretanto, nada impede que a Fazenda vá à Justiça contra uma decisão do Carf que contrarie a jurisprudência dos tribunais superiores.

“Ela [União] não está entrando contra a decisão [do Carf], está cobrando um débito de um contribuinte em face de uma decisão, por exemplo, contrária à jurisprudência. Essa possibilidade, a rigor, já existe em situações excepcionais, e já ocorreu, conforme me disse a procuradora-geral da Fazenda Nacional”.

Outras fontes consultadas pelo JOTA afirmaram que o estudo sobre a possibilidade de recurso ao Judiciário em casos específicos poderia ser uma das atribuições do Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais, criado pelo Decreto 11.379/23. A norma também faz parte do pacote econômico lançado pelo governo.

Procurado, o Ministério da Fazenda não confirmou se a União passará a recorrer de decisões desfavoráveis no Carf.

Fonte: JOTA

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